A Reforma Tributária e seus Primeiros Impactos no Mercado de Seguros
São Paulo, 10 de março de 2025
A reforma tributária aprovada no final de 2024, após 30 anos de discussões no Congresso Nacional, representa uma transformação histórica no sistema tributário brasileiro. O setor de seguros, que atualmente responde por mais de 185 mil empregos diretos segundo a CNseg, enfrentará mudanças significativas em sua estrutura de tributação.
Com a implementação da EC 132/23 e da LC 214/25, o mercado segurador passará por uma importante reestruturação tributária. O novo sistema substituirá diversos impostos existentes, como IPI, ICMS, ISS, Cofins e PIS/Pasep, por três novos tributos: o IBS, o CBS e o IS. Além disso, uma mudança notável será a extinção do IOF sobre operações de seguro prevista para 2027, o que promete impactar diretamente o setor.
Principais Mudanças na Tributação de Seguros
O novo sistema tributário brasileiro traz alterações substanciais para o setor de seguros. Atualmente, as seguradoras são submetidas ao PIS e COFINS com alíquota de 3,65%, sem direito a crédito, além do ISS municipal entre 2% e 5%, e o IOF federal.
Uma das mudanças mais significativas é a extinção do IOF sobre operações de seguro a partir de 2027, mantendo sua incidência apenas sobre operações de crédito, câmbio e títulos mobiliários. Ademais, o setor passará a ser tributado pelo IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), que incidirão sobre o valor do prêmio.
O regime específico para serviços financeiros, no qual as operações de seguro foram incluídas, apresenta características particulares. A base de cálculo será composta por:
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Receitas dos prêmios de seguros, resseguros, cosseguros e retrocessões
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Receitas financeiras dos ativos garantidores de provisões técnicas
Entretanto, a legislação permite importantes deduções:
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Despesas com indenizações
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Valores de restituição de prêmios
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Comissões de intermediação
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Prêmios com cosseguro cedido
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Constituição de provisões e reservas técnicas de seguro resgatável
A regulamentação estabelece ainda alíquota zero para operações de resseguro e retrocessão, inclusive quando os prêmios forem cedidos no exterior. O período de transição iniciará em 2026, com alíquota teste de 1% (0,9% CBS e 0,1% IBS).
Bernard Appy, secretário-extraordinário da Reforma Tributária, enfatiza que o objetivo é criar um sistema neutro, tributando o consumo final sem favorecer modelos específicos de negócio. No caso dos seguros de saúde, por exemplo, a tributação será equalizada com os planos de saúde, considerando que ambos têm o mesmo objetivo final para o consumidor.
A implementação dessas mudanças seguirá um cronograma gradual: extinção do PIS e COFINS em 2027, com entrada em vigor da CBS, seguida pela extinção progressiva do ICMS e ISS para implementação do IBS entre 2029 e 2032.
Impactos Imediatos para Seguradoras
As seguradoras brasileiras começam a se preparar para uma série de adaptações operacionais significativas. O setor, que movimentou R$ 660,5 bilhões em 2023, com crescimento de 10% em 12 meses, precisará implementar mudanças substanciais em seus processos de gestão tributária.
Uma das principais adaptações será o novo mecanismo de créditos tributários. As seguradoras estão articulando propostas junto ao Ministério da Fazenda para adequação ao regime fiscal. A proposta em discussão sugere a utilização de uma estimativa baseada na série histórica dos pagamentos aos segurados para calcular os créditos tributários.
Ademais, as seguradoras precisarão adaptar seus sistemas para emitir notas fiscais, uma novidade para o setor. O novo marco legal também estabelece diretrizes específicas para a operação das seguradoras:
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Proibição de cláusulas para extinção unilateral do contrato pela seguradora
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Prazo máximo de 30 dias para pagamento de sinistros
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Obrigatoriedade de questionário de avaliação de risco no momento da contratação
No que tange aos planos de saúde, a alíquota será unificada nacionalmente, com redução de 60% sobre a alíquota de referência. Esta tributação incidirá sobre:
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Receita dos serviços (prêmios, mensalidades e participações)
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Receita financeira das reservas técnicas
As seguradoras projetam um crescimento expressivo, com meta de alcançar 10,1% do PIB até 2030, equivalente a RBRL 5,80 trilhões em valores atuais. Para atingir esses objetivos, o setor planeja expandir sua atuação em diversos segmentos, incluindo automóveis, seguro de pessoas, crédito e garantia, transportes e rural.
Bernard Appy, secretário-extraordinário da Reforma Tributária, ressalta que o objetivo é criar um sistema que distorça o mínimo possível a atividade econômica. Entretanto, especialistas alertam que a definição das alíquotas pode resultar em uma elevação da carga tributária para o setor.
As mudanças não se limitam apenas à tributação. O novo Marco Legal dos Seguros estabelece uma arquitetura jurídica focada em transparência e confiança nas contratações, visando criar bases sólidas para um ciclo de crescimento sustentado do mercado.
Perspectivas para o Mercado
Segundo projeções da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), o setor de seguros brasileiro apresenta perspectivas promissoras, com expectativa de crescimento de 10,1% em 2025, alcançando uma participação de 6,4% no Produto Interno Bruto. Esse avanço está diretamente relacionado à retomada de investimentos em infraestrutura e grandes projetos.
No entanto, mais de sete milhões de empresas serão impactadas diretamente pela reforma tributária. Uma das questões mais delicadas é a indefinição das alíquotas, que dificulta a previsão precisa de perdas e ganhos para os diversos setores da economia.
O mercado de seguros de vida individual demonstrou crescimento expressivo de 18,7%, enquanto o seguro de grupo registrou aumento de 5,3%. Entretanto, alguns desafios precisam ser superados para garantir a sustentabilidade do crescimento. A digitalização e automação de processos emergem como pontos cruciais, exigindo investimentos contínuos em tecnologia. Além disso, a demanda corporativa está se tornando mais sofisticada, buscando apólices personalizadas que ofereçam flexibilidade e proteção efetiva contra riscos financeiros e operacionais.
O setor de saúde suplementar, que atende 58,8 milhões de pessoas, enfrenta desafios específicos. As fraudes representam perdas significativas, chegando a R$ 34 bilhões. Os reembolsos, que em 2019 somavam R$ 6 bilhões, alcançaram R$ 12 bilhões no ano passado.
A implementação do novo sistema terá um período de transição até 2033. Durante esse tempo, as empresas deverão operar simultaneamente sob os regimes antigo e novo, representando um desafio operacional significativo. Portanto, o sucesso da reforma tributária dependerá não apenas de sua regulamentação, mas também da capacidade do governo, do Congresso e da sociedade civil em construir um sistema mais eficiente e transparente.
Conclusão
A reforma tributária representa uma mudança fundamental para o mercado de seguros brasileiro. Certamente, o setor enfrentará desafios significativos durante o período de transição até 2033, especialmente na adaptação aos novos tributos IBS, CBS e IS.
As projeções positivas de crescimento, aliadas à meta de alcançar 10,1% do PIB até 2030, demonstram a resiliência do setor. Entretanto, questões como a indefinição das alíquotas e a necessidade de modernização tecnológica precisam ser equacionadas.
O novo Marco Legal dos Seguros estabelece bases sólidas para o desenvolvimento do mercado. As mudanças na tributação, principalmente a extinção do IOF sobre operações de seguro em 2027, devem contribuir para um ambiente mais transparente e eficiente.
Portanto, embora existam desafios operacionais consideráveis, as perspectivas para o setor segurador brasileiro são promissoras. A combinação entre regulamentação atualizada, digitalização dos processos e expansão dos diferentes segmentos deve impulsionar o crescimento sustentável do mercado nos próximos anos.
Referências
[1] - https://www.migalhas.com.br/depeso/425813/a-reforma-tributaria-e-seus-primeiros-impactos-para-as-seguradoras
[2] - https://fgviisr.fgv.br/sites/default/files/2024-03/Nota%20Tecnica%2011%20-%20Reforma%20Tributa%CC%81ria%20e%20o%20Setor%20de%20Seguros%20e%20Resseguros%20%281%29%20%281%29.pdf
[3] - https://tozzinifreire.com.br/boletins/a-reforma-tributaria-e-os-impactos-no-setor-de-resseguros
[4] - https://tozzinifreire.com.br/boletins/regulamentacao-da-reforma-tributaria-e-o-setor-de-re-seguros1
[5] - https://portal.fgv.br/noticias/especialistas-se-reunem-debater-impacto-reforma-tributaria-setor-seguros
[6] - https://www.poder360.com.br/economia/com-reforma-seguradoras-estudam-mudancas-em-calculo-tributario/
[7] - https://www.contabeis.com.br/noticias/64613/reforma-tributaria-seguradoras-estudam-mudancas-em-calculo-tributario/
[8] - https://fgviisr.fgv.br/sites/default/files/2024-08/Nota%20Tecnica%2016.pdf
[9] - https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2024/dezembro/nova-lei-de-seguros-e-sancionada-marco-legal-faz-parte-de-agenda-de-reformas-com-potencial-de-impulsionar-economia-sem-gerar-inflacao
[10] - https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2024/12/18/reforma-tributaria-estabelece-11-regimes-especificos-para-setores-da-economia
[11] - https://valor.globo.com/patrocinado/pressworks/noticia/2025/02/14/com-projecao-de-crescimento-de-10-em-2025-setor-de-seguros-enfrenta-desafios-e-oportunidades.ghtml
[12] - https://universodoseguro.com.br/reforma-tributaria-impoe-desafios-a-mais-de-7-milhoes-de-empresas-no-brasil/
[13] - https://www.infomoney.com.br/minhas-financas/mercado-de-seguros-vai-crescer-acima-de-10-em-2023-e-de-11-em-2024-projeta-cnseg/